sábado

CHORO QUANDO RIO

De repente você sente aquela alegria.
Aquela felicidade imensa, e você pensa:
- posso morrer agora.
Morro feliz, sem ninguém perceber que dentro do sorriso singelo,
A solidão espreita silenciosa em cada um dos cantos da boca
A lágrima ácida escorre lembrando o passado; trazendo a saudade.
E corro, corro sozinho
Corro tão rápido e amedrontado
(não quero que me vejam)
Tenho medo que perguntem....?
Tento esquecer minha dor.
Tento esquecer a cor de quem me viu
Chorar sozinho,
Gargalhar na roda.
Quero a queda mais profunda e fatal
Os olhos, as pessoas, as músicas...
Quero a queda fatal
Parar antes da dor,
Ante a dor!
E gargalhar dela.
To fudido meu bem, nem a dor eu consigo ter.
Estou num tempo que não tenho nada.
Nada você me entende? Nada!
Nem um pouco de compaixão.
Sequei. To seco como um carvão.
Se me queimam sou do mau
Se sorrio
Sou do mau
Se amo, e sempre amo.
Sou do mau!
Sou, não me querem mais.
Nem sabem que quando sonho...
Defino o BEM!
Eu sempre SONHO!
Basta!
Chega de me gritarem nos ouvidos,
Não suporto observar essa vida que se esvai
E economicamente ficar só olhando
Já desci onde ninguém jamais desejou estar
Também subi um pouco além do sonhado.
O momento assim como tudo,
Se faz dele mesmo, constrói-se dos instantes
Dos acasos
Eu negocio os olhares ao meu redor
Pra que espantados observem a plenitude da existência
E corram enxotados com sua boa educação
Pra longe de todos os meus desejos
Assim me deixam livre pra seguir
Por caminhos antes inexistentes
Outros conhecidos,
Por este mapa que vou tecendo
Dos afetos que colho dos tombos que levo
Dessa vida que me carrega, mas não me segura
Me bate, acaricia e eu abraço.
E bato, acaricio e abraço
Tem dias que quero
Apenas abraços
Em braços confortáveis
Sem tapinha nas costas
Sem olhares
E sem palavras.
Noutros gosto de berros
Urros, palavras gritadas
Sorrisos, gargalhadas
Ah! Essa vida que me tem
E eu tenho ela.

pra Maristela Trindade

terça-feira

Naquele dia ele acordou cedo. Como de costume, ele acordou cedo. Um cigarro a mais no cinzeiro, uma ruga a mais no rosto. Uma lágrima a menos nos olhos...
Naquela manhã um suspiro o arrancou do sonho. Um salto o lançou no vácuo. Naquele espaço-residência do vazio... onde a existência não existe. No não lugar, sem referência pra se saber quando se está em pé, sentado, subindo, caindo ou de cabeça pra baixo. Decidiu não estar. Mas, pra isso não existia escolha. Ele estava. Estava ali parado sem perceber nem mesmo há quanto tempo olhava fixo sua sombra na parede gasta.

segunda-feira

bem vinda!

Bem Vindas!
Sejam bem recebidas, todas.Sintam-se a vontade! Todos nós diferentes. Todos. Sintamo-nos confortáveis para sermos e assim confrontarmos crenças. Vamos fazer do diálogo, uma construção coreográfica da verborragia. Sejam todos bem vindos! Todos nós que sentimos pulsando o desejo de nos desvelar. Todos nós que sem medo abrimos a guarda e deixamos expostas nossas mãos vazias. (vazias e ansiosas por um corpo que abraça). E contamos um segredo. Um pro outro deixamos escapar a nossa dor. E entre braços nos sentimos confortáveis pra chorar. Um choro baixinho. Um pranto silencioso em segredo nos nossos ouvidos. Braços cúmplices que ouvem acolhedores sem querer falar. Sem tapinhas nas costas ou olhares. Apenas escutam e abraçam.

Sorrio

Tento parecer um pouco simpático. Olho de um lado pro outro. Sempre! Da direita pra esquerda ou o contrario. Olho como se meus dois ombros contemplassem dois amigos. Um claro e conhecido. Outro não tão claro, mas este eu conheço bem. Sorrio. Converso. Tento absurdamente parecer natural. Solto pela boca palavras incoerentes. Claro, fazem todo o sentido. Sempre soube usá-las. Palavras que pareçam amigas. Que disfarcem o enorme constrangimento entre nós. Palavras capazes de velar um sentimento. Palavras capazes de velar. Meu amor por ti esta velado. Guardo-o dentro, junto ao meu peito. Sem acesso, a não ser nosso.
Dos olhos parados a lágrima escorre leve. Delicada e persistente vai abrindo espaço entre os pelos arrepiados do peito. Sutilmente convida a entrar. Carrega suave por dentro de um corpo que já não tenta se esconder. A cada lembrança parece que a queda d’água se intensifica. É preciso atravessar a cortina molhada pra flutuar entre as galerias de um passado que se foi. Num instante a felicidade cai reta pra fora das pálpebras, o rosto numa tentativa desesperada de não revelar a tempestade, sorri calmo. Procura por todos os lados dois braços onde se aconchegar. Vasculha todos os cantos atrás de um olhar sutil. Com ternura consegue se abraçar sozinho. E por maior que seja o esforço não consegue mais esconder nada. Entrega-se pra si. Desaba sobre os próprios soluços tentando respirar um pouco. Afoga-se entre suspiros, lágrimas, saudades e sorrisos. Sorri pro próprio joelho. Não sente medo de estar ali, não sente medo de sair dali, não sente nada. Só o que quer é dormir. Dormir um sono profundo. Acordar como se nada tivesse acontecido. Caminhar como se não tivesse passado. Esquecer que um dia conseguiu permanecer com os olhos parados em algum lugar sorrindo. E sorrir outra vez.

domingo

um dia

Saí de casa por volta das três da tarde. Comprar cigarros e uma carrapeta. O motivo era esse. Comprei os cigarros, encontrei amigos. Caminhei pelo Catete, Glória e Lapa. Comprei a carrapeta. Que erro! Encontrei a carrapeta. Que erro! Coloquei a carrapeta no bolso, ou devo dizer: - Beijei a boca do capeta! Um erro maior ainda. Cumprida minhas tarefas, sentei em um bar qualquer, um vazio qualquer por dentro me incomodava. Tinha os cabelos em desalinho. Usava terno e gravata. Barba feita, dentes brancos. Eu tinha uma boa aparência. Desses que dizem: - Esse é pra casar! Um vazio qualquer me possuía inteiro. Tentei o celular, num impulso de sanidade. Estava sem bateria. Relaxei, pedi uma cerveja. A mais gelada. O primeiro copo bebi num gole só. Assim fui até a quarta garrafa. Nessa hora o mundo ao redor do meu coração começou a girar. O mundo ao meu redor começou a girar. “O roda-mundo roda-gigante. Roda-moinho roda-pião. O tempo passou num instante nas voltas do meu coração”. Tocava Roda Viva em algum desses apartamentos tipo quartosala em cima do bar. Eu sentado, com a carrapeta em minha frente, no centro da mesa e o vazio voraz por dentro, me consumindo. “A gente quer ter voz ativa, no nosso destino mandar” a música do andar de cima continuava tocando. Segurei, com o polegar e o indicador, a parte mais fina da carrapeta e a fiz dançar, girar, girar, girar e girar. A regra do jogo era só uma. Pra onde o pião apontasse eu caminharia. E seguiria caminhando até chegar em um muro, uma esquina ou sei lá o que. Lá rodaria a peça outra vez. Rodei, apontou pro leste. Paguei a conta, levantei um pouco tonto e caminhei. Passei por um homem velho, sentado que vendia flores murchas. Comprei quatro. Passei por um casal que brigava. E em meio às voltas dos braços estendidos no ar gritavam: - Nunca mais quero te ver! Parei na esquina. Uma encruzilhada. Coloquei uma flor em cada ponta de cada rua e girei o pião. Continuei caminhando. Seguia sempre a indicação da carrapeta, caminhava sem saber pra onde. Estranhamente o vazio se transformava em ansiedade. Não conseguia mais parar o jogo. Em outra esquina, a seta apontou oito vezes para a porta entreaberta do prédio ao meu lado. Entrei devagar. Pedi um wiskhy. Sentei na mesa em frente ao palco. Ninguém, a não ser eu e o garçom que me servia. O globo espelhado no teto começou a girar. Reflexos por todos os lados. Nas paredes, no chão e em mim. Pedi outra dose. Uma cortina velha de veludo vermelho começou a abrir um pouco engasgada pela ferrugem da engrenagem. No palco, um homem sentado de frente pra mim, bebia wiskhy e fumava um cigarro atrás do outro sem dizer nenhuma palavra. Eu olhava ele nos olhos. Ele me olhava como se soubesse tudo o que tinha acontecido. Me olhava como se soubesse exatamente com quantos travestis eu tinha trepado. Aqueles olhos pareciam saber quantas garotas de doze anos eu tinha comido depois de passar pelo velho das flores. O vazio voltava a ser meu recheio. Agora eu tinha os cabelos em desalinho um pouco grudados neles mesmos. Usava terno. Barba por fazer. Os dentes não sei como continuavam brancos. A boca tinha um péssimo cheiro de podre. Duas luzes acenderam ao mesmo tempo em que tudo apagou. Uma no homem sentado no palco, outra em mim. Tirei o casaco junto com o homem. Enrolei as mangas da camisa e deixei a mostra os hematomas e as picadas, presente do dia em que a carrapeta me levou para uma rua sem saída. Fiquei um pouco incomodado, mas quando olhei pra frente, percebi que os braços do homem no palco eram iguais aos meus. Mais uma dose, e continuei olhando. O cigarro no cinzeiro lotado desenhava com a fumaça um labirinto de caminhos parecidos com os que eu tinha percorrido. Os olhos, isso eu percebi nos olhos do homem, estavam vermelhos e irritados. Ardiam! O outro coçava com o dorso da mão esquerda o olho do mesmo lado. Lembrei dos outros homens de terno e gravatas, pelo menos quarenta anos mais velhos que eu. Conheci-os por acaso, como todas as outras coisas, tudo naqueles últimos dias acontecia por acaso. Foi por uma das ruas que passei. Foi um aceno, um Olá! E eu sentei. Começamos a conversar.

segunda-feira

Muda

Bom eu...eu comecei a trabalhar com tradução ainda pequeno. Tive um colega no jardim de infância, o Ayrton. Eu ensinei ele a falar jipe. Todos os dias durante um ano eu gritei jipe no ouvido dele. É, eu gritei. E gritei porque ele era surdo. Ele aprendeu a falar jipe. E eu, eu digamos assim “peguei gosto por surdos”.
Depois do Ayrton tive muitos outros amigos surdos. É estranho como uma coisa não existe pra você, e depois que você ouve falar nela a primeira vez, ela toma conta da sua vida. Comigo foi assim. Depois do Ayrton, tudo virou surdo. Quase que eu fiquei surdo.
Teve a Paula também. A Paula morava perto da minha casa. E apesar de surda, me ligava todos os dias. Fiquei apavorado a primeira vez que ela telefonou. Já imaginou uma conversa telefônica com um surdo? Naquela época não existia celular, enviar mensagem, nada dessas coisas. Enfim. A Paula fazia fono quase todos os dias. Estava aprendendo a falar. O problema é que ela não ouvia quando eu falava. Mas, graças a deus não era isso. Ela queria que eu fosse pra janela, dava pra ver a janela dela da minha. Passávamos horas conversando na janela. E tudo que se dizia era em segredo. Era em silêncio.
O que gosto nos surdos é que eles não te ouvem falar, eles te veêm falando. E você também, você vê eles falando. Nessa época tive vontade de ter um filho surdo, com a Paula.
Você pode dizer o que quiser prum surdo. Ele nunca vai saber, a não ser que você esteja na frente dele, e de frente pra ele, falando tudo bem devagar e articulado. Ou usando as mãos.
Os surdos tem uma maneira engraçada de nomear as pessoas. O meu nome era um “F”na orelha direita, porque eu ouvia direito, a Dani, irmã da Paula era um “D”na testa, ela tinha batido de cabeça numa árvore. E a Paula, era um “P” na orelha esquerda, ela não ouvia. Eu e os outros, nossos outros amigos chamávamos ela de Pau-lá. Ela não gostava.
Hoje em dia trabalho com tradução em palestras. Geralmente de cegos pra surdos, ou de surdos pra cegos. E os assuntos giram em torno de viver ouvindo ou viver olhando. Quando o palestrante é cego, eu fico de costas pra ele e de frente pra platéia. Quando ele é surdo, eu fico de costas pra platéia. Esse meu trabalho me faz pensar em algumas coisas do tipo. Vocês já imaginaram como é viver sem ouvir nada? Como é dançar sentindo uma eterna vibração silenciosa? Ou ainda, construir formas, dar corpo as coisas sem ter nenhuma referência visual? Qual a eterna cor que um cego enxerga. Preto, branco, verde, azul. É sempre uma eterna mancha colorida ou sem cor, ou ela muda? A Paula era muda. Uma vez perguntei isso pra um palestrante cego. Qual a cor que você sempre vê/ Ele ficou mudo. Aí fudeu. Já pensou um cego mudo? As pessoas devem achar que ele é autista. Mas não, ele só é cego e mudo. E se for surdo também? Não, aí não dá. É melhor ser paralítico.
Tá, tudo bem to fugindo do assunto. Tem horas que eu fecho os olhos e fico tentando ouvir meu corpo, tentando inventar as formas que o corpo constrói no espaço. Noutras eu tampo os ouvidos e tento sentir a vibração das coisas, tento descobrir qual o som que faço vibrar de mim. É engraçado esse poder que o corpo tem de produzir vibrações, construir formas, moldar o espaço e reverberar tudo. Acho que um surdo é sempre mais bonito que um cego. Eu nunca vi um espelho na casa de um cego. É difícil tatear a imagem refletida, dar forma a ela.
Os cegos, os cegos acho que eles tem mais tato que os surdos. Eu tive um massagista cego. Até hoje não sei se ele me massageava ou me olhava. Os olhos deles são nas mãos, uma visão tátil. Acho que dá pra falar assim.
Tem uma coisa que me incomoda. Eu gosto de conversar olho no olho. Com qualquer pessoa. Com os cegos é difícil isso, eles não te olham no olho. Nem te olham. E com os surdos? Esses prestam atenção nas tuas mãos ou na tua boca. É estranho. Bom, enfim, acho que os surdos vivem sentido o mundo vibrar. E os cegos, tenho a impressão de estão sempre ouvindo Vinícius cantar. Essa é minha profissão, minha lida.... Tem dias que eu sou os olhos de alguns, noutros eu sou os ouvidos.
Oi Bia...
Hoje pela manhã, depois de reler algumas de suas cartas, mergulhei fundo em um mar cor-de-rosa de águas macias como algodão. Oscar nosso macaco veio comigo, sempre agarrado nas minhas costas. E depois de mergulhar fundo, cada vez mais fundo, sem saber se estávamos indo pra cima ou pra baixo, mas mesmo assim continuamos indo fundo, sempre soltos... Chegamos a AMIANUCAM.
AMIANUCAM é fantástico, é um mundo fantástico, maravilhoso, lá nunca se tem certeza se estamos subindo ou descendo, se andamos pros lados ou se corremos em diagonais. Flutuar, este é o verbo certo! Em AMIANUCAM se flutua, se voa, lá flutuamos o tempo todo. Ela ou ele não possui nada, e possui tudo o que quisermos.
AMIANUCAM é tão fantástico por isso, é um lugar que brinca com esta relação oposta do nada e do tudo, é a própria ponte entre ficção e realidade.
Em AMIANUCAM, basta um desejo ou um descuido e pronto: - Tudo muda, se trnasforma tão rapidamente que acabamos perdendo horas, dias... jogando um prazeroso exercício de imaginação.
- Ganhamos horas, dias... com esta brincadeira!
Não tenho como descrever AMIANUCAM, este lugar é o que se quiser que seja, tem em si o que se quer que tenha.
Depois que fui pra lá pela primeira vez, passei a carregar AMIANUCAM comigo assim como Oscar o macaco.
E pra finalizar esta carta (preciso chagar ao fim quero me ganhar em devaneios de novo) tenho que te agradecer Bia. Meu passaporte pra AMIANUCAM foram as cartas suas que li. Elas me deram a leveza, o passe-livre pra esta terra sem fronteiras, sem tempo, nem lados ou círculos. E ao mesmo tempo cheia de tudo isso, de tudo o que se quer, o que se quiser, aqui o tempo também não interessa.
Daqui de AMIANUCAM, te mando beijos e te agradeço. Eu e Owhiskar, o leão.
De lá até aqui foram-se minutos
pra não contarmos os segundos (sempre mais fartos que as horas)
Que me são fardos nas demoras
De não tropeçar, procuro sempre cair
Caído te vejo por baixo, o vestido sem vestir
Eu, sentado sem agir,
sem fingir que ontem nossa distância era a ponte
nossa permissão o pedágio pago na saudade
Na absurda vontade de vomitar os desejos
De cuspir medos,
eles todos em segredos arrotados
ao pé do ouvido (do seu)
Titi, tata...
Tantos que falam
me ensurdecem
o devir pensado em letras
Não temo, nem a dor
nem a exaustão
Um gole e um cigarro me deixam, me confortam
em braços que um dia queria teus

Para Betariz Provasi
Bia,
Hoje te escrevo de um país que não sei o nome. As pessoas riem e se abraçam, pouco depois devoram-se, e aqui não falo de comer coração.
Comem o fígado, o pâncreas, os rins... Comem o outro inteiro, sem piedade e sem amor.
O lugar é incrível. Eu poderia dizer que estou em qualquer lugarejo da África. Uma aldeia pós-moderna. Onde as hienas se disfarçam de leões. As pessoas se disfarçam de objetos. Todos, realmente todos procuram ter utilidade. Todos possuem serventia, basta revelar-nos os sonhos. São sedentos. Temerosos da inutilidade. Riem e rugem.
Desta vez vim sozinho, não trouxe nenhum dos nossos Oscares. E nem quero levar presentes daqui. Parecem falsos. Frágeis, prontos pra quebrarem no primeiro afeto. São alegorias tristes. Bichos-preguiça com despertador implantado na cabeça. Se misturam sem perceber, sem querer. Quase sem saber que as maiores toxinas vêm da mistura inconseqüente. Transitam solitários pelos salões sem nobreza nenhuma. Circulam com xales, e argolas, tentam se destacar da multidão por um punhado de abraços. Entre gestos e dentes querem sair da vitrine.
- Me compre, sou da melhor qualidade.
- Me leve no bolso. Sou leve, carrego sonhos no passado.
- Deixe esse aí, é pesado.
Eu vou contigo te dou meu braço. Quero só um abraço.
Todos sem exceção berram, estão cansados, querem sair daqui.
Suplicam que a flecha os acerte o peito e em estremecido desespero os faça despencar numa queda ascendente, de volta à superfície.
Descobri um presente pra você. Depois de dias e noites misturado invisível. Descobri um Oscar. Ele me abraçou, envolveu inteiro. Falou baixo o seu nome (por isso é seu). O camaleão Oscar. É quase como se fosse a máscara do Arlequim. Ele nos faz andar por aí, se misturar sem ser percebido. Ele explode o ponto. Rasga o peito em devaneios mas nos protege das hienas leões.
Em Oscar, desta viagem, trago dois, um pra mim, e outro pra você.
Com tantas viagens meu bem. Precisamos dele. É nossa carta na manga. Nosso trunfo. Nosso passaporte pra cruzar as fronteiras sem sermos vistos.
Te entrego por carta, disfarçado em carta nosso Amuleto.
Com amor.
Fer (em alguma terra distante)
oi meu bem...não fui pra Marte, na verdade peguei uma carona rumo a marte, mas no momento exato do retorno mais próximo da Glória saltei. Um triplo twist carpado no melhor estilo Daiane dos Santos e alguns metros engatinhando em direção ao topo do morro parei no colo da Santa. Um país diferente, com pinheiro piscante. Acho que ele me namora ou eu namoro ele, ainda não entendi nossa relação. Com mãe, irmã e cunhado todos de fora, agora invadiram meu espaço, e eu estou adorando. Pouco álcool o cigarro acabando, nem banho tomei, não por sentir frio, quero continuar sentido o suor de um dia de compras de Natal.Passei pelo deserto do Saara sem camêlo fui com dois pés deu preguiça de andar de quatro. De lá dei a volta ao mundo. Pra parar aqui de onde vejo de frente, mas só o teu reflexo. São as posições do olhar que conduzem nossa direção ou os artifícios pra nos colocarmos em direção um do outro. Nunca soube a resposta e nem se isso é de fato uma pergunta. Os Japoneses? Não os quero sinto como se me olhassem sempre por trás de uma cortina. Não gosto. E você, hoje viaja pra onde?
Do útero não lembro nada.
Tenho uma fantasia
Um ponto luminoso que quica de parede em parede
e de repente
te cai no mar.
Da minha casa tenho as referências
Do bonito do inteligente
Do como devo ser e não sou.
Escolho ser educado, um gentleman!
Agradável, doce no falar
E carente no olhar.
Tenho um desejo escondido.
Voar nas costas de uma borboleta.
Sentir o vento no rosto
E nunca ter um objetivo certo,
Um porto-destino.
Queria mesmo era recolher a âncora,
rasgar o peito
Ver todo meu pranto vermelho derramado,
e nele sim,
levantar as velas.
E me ser eu, eu pra ti
sem pensar, sem ponderar
gestos nem navalhas.
Mostrar meu corte ainda aberto
E não deixar secar minha lágrima.
Queria ser carregado pela mão,
não pr’um campo verde.
Mas, pro meio de um turbilhão
E lá no centro te pegar pela mão
e rodopiar.
Brincar de ser eu o teu dono.
De ser eu a borboleta.

Eu disse não ser mas talvez seja
talvez eu não me perceba
que no sonho a voar nas asas de uma borboleta
seja eu o pássaro a voar mais alto
o que não se sabe
que caiu do ninho
ainda pequenino, e agora sempre sozinho
asas quebradas, ferida aberta
sem saber que ainda é canto
o que meu chorar
que é sempre canto
o meu lamento
que eu canto e vôo, passarinho
mas penso que passo, no meu canto, sozinho,
sem que ninguém me perceba passar

Fernando Klipel e Beatriz Provasi
Meus olhos repousam lá, onde se juntam o branco e o azul. Naquela linha, ali na frente. No limite certo entre um e outro, no recorte desenhado, pintado, retilíneo do início ao fim. Onde nosso macaco Oscar me observa do alto de uma montanha com espelhos e cabide. Donde posso ver as estrelas através do vento. Oscar segura uma mão na outra como se tivesse conseguido abraçar o véu leve e suave no meio do azul e te manda beijos.
É aqui que descanso meu corpo em pensamentos. Meu joelho antes equilibrando a coisa amarela, cede, empresta e agora acomodo meu queixo.
Vim parar numa ilha Bia com araras carrancas africanas, havaianas pumas.
Gatos cachorro e buda.
To deitado no meio dela, na parte mais macia. Escolhi o melhor lugar pra poder esquecer tudo, inclusive que tudo isso era para escrever uma carta.
Viemos tantas vezes juntos aqui. Outras tantas eu venho sozinho. Sempre venho.
Os últimos dias tenho passado bem próximo ao mar, basta atravessar a rua.
Mas, não atravesso. Tem um morcego solitário que me espera pra conversar. E seria uma maldade com ele eu ir pro sol e deixá-lo me esperando.
Amanhã vou tentar fazer as duas coisas.
Mas hoje não, hoje estou nessa ilha, na melhor parte dela, sob o céu artificial, com centro nas costas.
Deitado em molas...
Abraçado no Fom te escrevendo.
Beijos Bia. Precisamos marcar acertar uma escala.